Após o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) favorável à “quebra” de decisões definitivas, contribuintes decidiram voltar à Justiça para reduzir a conta do que têm a pagar, afastando a incidência de multas e juros. Uma das primeiras decisões beneficia a Heineken/ Kaiser e foi proferida pela 3ª Vara Federal de São José dos Campos (SP).
Em fevereiro, ficou definido pelo STF que sentenças tributárias dadas como definitivas deixam de ter efeito sempre que houver um julgamento posterior na Corte em sentido contrário (RE 955227 e RE 9492 97). Significa que o contribuinte que discutiu a cobrança de um tributo e teve a ação encerrada a seu favor – autorizando a deixar de pagar – perde esse direito se tempos depois os ministros julgarem o tema e decidirem que a cobrança é devida.
Apesar de terem que pagar a dívida principal, o julgamento do STF, até então, não falou nada sobre multas e juros – o que pode ser definido em recurso (embargos de declaração). O caso em discussão no STF trata da cobrança de CSLL, declarada constitucional no ano de 2007.
O tema é discutido não só na esferas judicial como administrativa – onde há pelo menos dois julgados sobre a questão. Os dois abordam pagamento da CSLL.
Na Justiça, a decisão favorável à Heineken/ Kaiser foi dada pelo juiz federal Renato Barth Pires. Ele destaca, na liminar, que “o periculum in mora decorre dos graves prejuízos a que a impetrante estará sujeita caso venha ser cobrada pelos valores em discussão com incidência de multa e juros”.
O advogado que assessora a Heineken/ Kaiser, afirma que o pedido judicial segue o que tem sido discutido no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Está fundamentado no parágrafo único do artigo 100 do Código Tributário Nacional (CTN), que afasta as penalidades quando o contribuinte cumpre a legislação tributária e decisões com eficácia normativa (coisa julgada).
O pedido também menciona o parágrafo 2º do artigo 63 da Lei n° 9.430/96. O dispositivo diz que a interposição da ação favorecida com medida liminar “interrompe a incidência da multa de mora, desde a concessão da medida judicial, até 30 dias após a data da publicação da decisão judicial que considerar devido o tributo ou contribuição”. Além de citar precedente, de 2021, do Órgão Especial do TRF-3 (processo n° 5000092-39.2018.4.03.6143).
No Carf, há um precedente de 2018, anterior ao julgamento do STF, que admite a cobrança da CSLL, mas excluiu juros e multas. E um mais recente, de março, que manteve a cobrança do tributo, além das penalidades.
O caso recente envolve uma agroindústria, autuada pela Receita Federal por não recolher CSLL em 2008 e 2009. O órgão ainda exige multa isolada pela falta de recolhimento de estimativa mensal, multa de ofício de 75% e juros moratórios.
O caso foi analisado pela 1ª Turma da 3ª Câmara da 1ª Seção. Os conselheiros entenderam que caberia o pagamento de CSLL desde 2007, quando houve julgamento do STF, e manteve o auto de infração – com o principal, além de multas e juros moratórios.
De acordo com a relatora, conselheira Giovana Pereira de Paiva Leite, em razão do julgamento do STF, que declarou a constitucionalidade da Lei nº 7.689, de 1988, que trata da cobrança da CSLL, com efeito erga omnes, a contribuição social passou a ser devida por todos os contribuintes, inclusive aqueles que possuíam ação com trânsito em julgado.
Para ela, a partir de agosto de 2007, data em que a decisão foi publicada, a Receita Federal poderia voltar a cobrar o tributo, com multas e juros. Ela ainda cita, na decisão, o julgamento do STF que tratou dos limites da coisa julgada (processo nº 10665.722738/2012-11).
Já o precedente favorável aos contribuintes no Carf, de julho de 2018, beneficiou uma montadora de automóveis. O caso também tratou de CSLL. A 2ª Turma da 3ª Câmara da 1ª Seção decidiu, por unanimidade, manter a cobrança, mas afastou multa de ofício e juros de mora.
Na decisão, o conselheiro Carlos Cesar Candal Moreira Filho cita o julgamento do Supremo que, na época, ainda não tinha estabelecido limites à coisa julgada. Diz que a solução para o caso deverá vir dali. Mas ao analisar o tema das multas e juros, citou o inciso III do artigo 100 do Código Tributário Nacional para excluir o pagamento (processo nº 19515.000797/2004¬13).
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda (PGFN) não deu retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico