A reversão do corte de 35% do IPI promovido pelo ex-ministro Paulo Guedes está no cardápio de possibilidades de medidas a serem anunciadas em breve pela equipe econômica para tentar reduzir o déficit primário de R$ 231,5 bilhões do orçamento. Diante da hipótese de reoneração, já havia alguma movimentação de bastidores no setor industrial para tentar demover o governo de dar sequência nessa proposta, antes do seu anúncio oficial.
Assim, até a última hora, ela pode sair da lista de iniciativas, o que não seria inédito na história do Ministério da Fazenda. Nas últimas horas, ganhou força a ideia de se fazer um pente-fino nessa desoneração para identificar quais teriam méritos para ser ou não mantidas, o que pode deixar a iniciativa para uma segunda rodada de ações do governo.
Mexidas no IPI têm múltiplas implicações. Para cima, então, os efeitos são ainda mais complexos. Um problema imediato é o potencial de impacto inflacionário. Mesmo com o corte feito por Guedes, a inflação de bens industriais (que tem peso de 23% no IPCA) terminou o ano passado em 9,54%. É um patamar elevado, que pode ficar ainda pior, caso o ministro Fernando Haddad insista na medida.
A iniciativa também representaria um problema para as empresas do setor industrial, cuja recuperação, durante a campanha e também na transição, foi apontada como prioridade. Inclusive em sua posse como ministro da Indústria, Comércio e Serviços, o vice-presidente Geraldo Alckmin falou de retomada da indústria. Praticamente todas as companhias industriais já fecharam seus orçamentos do ano prevendo um cenário de IPI menor, planejaram suas decisões, inclusive de investimentos, com esse cenário.
Mesmo considerando que o tributo será integralmente repassado ao consumidor, a eventual iniciativa interfere no mercado em um prazo muito curto desde o corte do imposto, reforçando a percepção de improviso e total falta de horizonte de planejamento no país chamado Brasil.
Por outro lado, do ponto de vista fiscal, a medida é bastante defensável. Como corretamente disse Haddad no início do ano, é inaceitável um déficit de R$ 231,5 bilhões. No momento não há qualquer justificativa para isso. Especialmente depois de dois anos de superávit primário.
Como foi eleito um governo de esquerda, com promessas de medidas sociais, é natural que o ajuste ocorra mais pelo lado da receita, ainda que no pacote em gestação haja algumas medidas também do lado das despesas.
Dessa forma, faz sentido o governo trocar um pouco mais de inflação no curto prazo derivado de aumento de tributos (além do IPI há boas chances de se anunciar a volta da tributação de PIS/Cofins sobre a gasolina a partir de março) pelo reequilíbrio das contas públicas. Especialmente em um cenário que se torna cada vez mais provável de descumprimento da meta inflacionária em 2023.
Com uma melhor ancoragem fiscal, a tendência é que os juros de longo prazo reduzam prêmios, favorecendo o cenário de investimentos. Além disso, contas mais equilibradas, com dívida sob controle, devem ajudar o processo de controle da inflação de longo prazo pelo Banco Central.
Outro aspecto importante é que o IPI mais alto ajuda também na recomposição do caixa dos estados e municípios, já que o tributo compõe os fundos de participação desses entes.
No orçamento de 2023, a estimativa de renúncia de receitas com o IPI era de R$ 27,3 bilhões. O retorno ao nível anterior em tese exige noventena, ou seja, ela entrará em vigor três meses após eventual publicação do decreto, diminuindo os ganhos arrecadatórios neste ano.
O anúncio das medidas fiscais está previsto para ocorrer entre esta quinta (12) e sexta-feira (13). A ver qual será a decisão final de Haddad, que corre contra o tempo para conquistar credibilidade junto ao mercado financeiro.
Fonte: JOTA